Nossas leis penais somente são discutidas quando ocorre um caso de repercussão. Agora voltou o tema da redução da maioridade penal. Tema desgastado e sem nenhum sentido.
O único fundamento é o de que o "menor" fica detido apenas três anos na "Febem", atual Fundação Casa e este tempo é muito pouco como punição.
Aliás, a pergunta sobre o tempo é a essência do Direito Penal, seja da ordem da criminalidade adulta, seja infantil.
Qual é o tempo "correto" para se deixar alguém detido a fim de valer como punição por seu crime?
Estudar direito criminal resume-se nessa pergunta.
No caso da criminalidade infantil, a resposta não está na redução da maioridade penal.
Está numa mudança do ECA!
Mas não adianta mudar a lei, tem de ser mudada a visão de mundo sobre o combate à criminalidade juvenil.
E chega de argumentos.
Para colaborar concretamente. segue uma proposta de projeto de lei para mudança do ECA.
Ele é fruto de estudos de um pequeno grupo que hoje se dissolveu e cuja redação final foi dada por mim.
Foi encaminhada à Câmara dos Deputados e abraçada por ninguém menos que o então Deputado Clodovil Hernandes, que não era especialista no assunto, mas se interessou pela discussão do problema.
Com sua morte, não foi para frente.
Segue o texto para apreciação do leitor.
Proposta de
Projeto de Lei nº
Altera a Lei nº 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente
Art. 1º Os
dispositivos da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, a seguir indicados,
passam a vigorar com a redação seguinte:
Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a
medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente.
§ 1º. A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso,
a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.
§ 2º. A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses
e prazo máximo de dois anos, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada
ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o
defensor.
........................................................................................................
Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início,
ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de
atividades externas, independentemente de autorização judicial.
§ 1º. São obrigatórias a escolarização e a profissionalização,
devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na
comunidade.
§ 2º. A medida será fixada pelo juiz e terá o prazo máximo de 3 anos.
Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade,
respeitadas as garantias fundamentais e a dignidade humana da pessoa em
desenvolvimento.
§ 1º. Será permitida a realização de atividades externas, a critério
da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em
contrário.
§ 2º. A medida não comporta prazo determinado, porém no máximo a cada
doze (12) meses, sua manutenção deve ser avaliada por meios técnicos adequados
e sua continuidade determinada mediante decisão fundamentada.
§ 3º. Após três anos de internação, o adolescente deverá ser submetido
a avaliação, a qual, se não indicar a liberação imediata, deve especificamente
analisar a possibilidade de substituição para medida de semiliberdade ou de
liberdade assistida
§ 4º. Atingido o período de cinco (5) anos, o adolescente será
colocado em regime de semiliberdade, salvo se, diante da específica gravidade e
ofensividade do ato infracional, for verificado mediante avaliação que o
adolescente ainda não apresenta condições de personalidade para o convívio
social.
§ 5º. Se o caso concreto o exigir, o adolescente que complementar
dezoito (18) anos permanecerá em cumprimento da medida, devendo ser o despacho
fundamentado por todos os elementos de convicção do juiz.
§ 6º. O período máximo de internação não excederá a oito (8) anos,
sendo a liberação compulsória aos vinte e seis anos de idade.
§ 7º. Toda desinternação será precedida de autorização judicial, após
a avaliação adequada.
Art. 2º. Esta lei entra em
vigor no dia de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
A presente proposta visa alterar dispositivos
do Estatuto da Criança e Adolescente – ECA – relativos à liberdade assistida,
ao regime de semiliberdade e à internação.
A primeira alteração, referente ao artigo 118,
tem por fim criar um prazo máximo para a liberdade assistida, fixando-se assim
um parâmetro necessário para essa medida.
Sugerimos também a alteração do artigo 120 do
ECA, para constar um prazo máximo de 3 anos para a medida de semi-liberdade em
razão da alteração proposta para o prazo da internação, o qual prescrevia
anteriormente o prazo máximo de 3 anos e será alterado segundo o projeto para 8
anos.
Por fim, a alteração mais importante é aquela que se
refere à internação, prevista no art. 121 do ECA.
Primeiramente a sugestão prende-se ao fato de
que três anos como prazo máximo é insuficiente para qualquer resultado efetivo
da medida, mesmo que no sistema atual seja prevista avaliação semestral do
adolescente.
A prática demonstra que a grande maioria dos
internos (com exceções muito reduzidas) permanece o período completo no sistema
de internação, que acaba privilegiando a privação da liberdade, deixando de
lado sua função socioeducativa. Ao aumentar-se o prazo, o que não impede que a
internação seja mais curta, permite-se introduzir uma noção de “progressão” no
percurso da medida, no sentido de que o infrator inicie seu cumprimento em
internação e caminhe para a semiliberdade e para a liberdade assistida.
Incluem-se também, como critérios de análise
da continuidade da internação, os conceitos de gravidade específica e
ofensividade do ato infracional, o qual configura crime e recebe denominação
específica ao ser praticado por criança e adolescente. Assim, a classificação
doutrinária de delitos em relação à sua potencialidade ofensiva pode e deve ser
considerada efetivamente dentro do ECA, uma vez que já é integrante do sistema
jurídico brasileiro de acordo com a Lei nº 9.099/95.
Cuida-se aqui de trazer para o ECA a análise
efetiva dos efeitos socialmente ofensivos do crime praticado pelo adolescente,
efeitos estes que exigem a internação do jovem. Tal análise deve ser aliada às
condições de personalidade do mesmo adolescente, para se avaliar a
possibilidade de sucesso ou não da reeducação proposta pelo sistema.
O prazo máximo de internação passa a ser de
oito (8) anos, colocando-se ainda como limite máximo de internação a idade de
vinte e seis (26) anos. Sob esta perspectiva, o jovem infrator passa a ser
contemplado como um tipo especial de criminoso. Se ele se inicia na atividade
criminosa na adolescência, por este motivo, deve ser tratado pelo sistema de
forma diferenciada, no sentido de ser buscada sua recuperação de modo
específico em relação à sua juventude. Se o indivíduo começa cedo na atividade
criminosa, o enfoque educacional é mais importante para se evitar a
reincidência. Um critério meramente cronológico, relacionando a liberação com a
maioridade, não tem fundamentação científica adequada para produzir efetivo
combate à criminalidade juvenil. O fato do indivíduo completar dezoito (18)
anos não implica direta e imediatamente na formação de um juízo de reflexão que
impeça a reincidência. Ao contrário, o jovem fica pouco tempo no sistema para o
fim de sua recuperação, porém o bastante para conhecer outros aspectos da
vivência criminal e aprender conteúdos socialmente negativos para sua formação.
Dessa forma, completando a maioridade e deixando o sistema, ele se encontra na
fase adulta no vigor da maturidade e pronto para atuar com maior desenvoltura
na vida criminosa, cujo sabor já experienciou dentro do sistema. Sem uma
perspectiva de longo prazo, utilizando-se apenas o critério cronológico,
alimenta-se um modelo que auxilia na formação de personalidades criminosas a
partir da adolescência. O modelo mais correto deve ter em vista a figura do
jovem criminoso, o qual não deve ser contaminado com o sistema proposto para
adultos, mas, diversamente, deve ser orientado para construir sua personalidade
e suas futuras ações fora do mundo do crime.
Nos casos extremamente graves, de doença
mental incapacitante, abre-se a possibilidade de o juiz determinar tratamento
de saúde em estabelecimento adequado, depois de devido processo de internação e
como incidente à execução da medida.
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