João Ibaixe Jr
É possível leitura unir presos e candidatos? Sim. O preso
que lê pode sair da cadeia mais cedo. E o candidato se liberta da prisão de sua
ansiedade. O estudo redime a ambos e os alivia da pesada carga que carregam em
sua alma: o medo do fracasso.
Quem é condenado a um crime, é sentenciado não a uma pena,
mas ao fracasso; o fracasso em sua intenção de viver mais abastadamente,
segundo pensava; viver mais intensamente, segundo desejava; viver melhor, segundo
sonhava.
O candidato ao exame da OAB também sente uma condenação em
seu espírito. Após ter vencido a etapa da formatura, ter galgado cinco anos
exigidos para sua formação como bacharel, vê-se lançado à obrigação de prestar
prova para conquistar a carreira de advogado.
Ambos, preso e aluno, estão envolvidos no sempre presente
drama humano histórica, mitológica e literariamente constante de superarem-se a
si mesmos por meio de percursos que devem ser trilhados para se conquistar
algo. São as chamadas provas iniciáticas, que nestas duas categorias tem
significado praticamente único. O preso só volta ao convívio social após vencer
sua pena, o candidato, ao vencer sua prova. E nada disto tem a ver com justiça.
Por que falar em união entre presos e futuros advogados? Será
porque, como querem alguns auto eleitos paladinos da justiça, os advogados mereceriam
estar todos atrás das grades por defenderem criminosos?
Não, caro leitor. Presos e candidatos à OAB estão unidos por
outras circunstâncias.
A um mês da véspera do Natal, um juiz de Santa Catarina
decidiu algo inédito: conceder remição da pena a presos que realizarem uma
única atividade, a da leitura.
A ideia é o preso diminuir sua pena pela prática continuada
da leitura. Como? O preso que ler um livro e fizer um relatório dessa leitura
reduzirá sua pena em quatro dias. O estudo de uma obra o conduzirá à redução de
sua pena.
Os defensores de se jogar o condenado na cadeia e sumir com
a chave se arrepiarão todos. Afinal, o problema carcerário se resolve com penas
eternas. Estes são os mesmos que falam em crimes de homofobia e de pedofilia ou
mesmo de bigamia, com penas mais graves que o homicídio, desde que esteja na
moda. São os que não conhecem realidade alguma, pois pretendem sempre ficar no
plano do politicamente correto.
A literatura pode sim redimir almas. A leitura é um
mecanismo humano quase mágico, quando feita com lúdica seriedade – aquela mesma
das crianças quando brincam. Ela mergulha o espírito num ambiente que o torna
quase invulnerável, o do imaginário. Um espaço irreal, mas do qual, quando se
emerge, sente-se de forma muito mais vibrante todo o mundo ao redor.
Se o projeto desse juiz catarinense for seguido com
compromisso, presos serão resgatados, certamente.
E os candidatos? A leitura é também essencial. A
compreensão, importantíssima. A memorização, fulcral. Não desperdice seu tempo
com leituras supérfluas, com citações sem referência do facebook, no qual vemos
Shakespeare falar coisas que nunca escreveu, em que vemos a imagem de índio
americano ao lado da poesia de Pessoa. Esqueça essa besteira. Estude seriamente.
Aqui a compreensão tem de estar ligada à memorização. O candidato
tem de lembrar-se de temas, assuntos e pontos. É uma prova de conhecimentos
gerais a ser superada.
Agora, quando for aprovado, como advogado, o método de
leitura será outro. Não estude mais para colorir suas petições. Não cite Platão
e Aristóteles a torto e direito. Eles nunca foram advogados. Eram filósofos e
como tais podem colaborar em nossa reflexão sobre a vida. Essa vida que vivemos
e cujo futuro tememos por nos ser um grande desconhecido.
Confie em si, confie em seus ideais, busque a aprovação. Mas
não se esqueça, você está lutando para ser advogado. E advogado é aquele que
tem a missão específica de ser chamado para defender seus concidadãos quando
cada um deles sente medo e não tem condição, sozinho e isolado, de enfrentar o
percurso que o pode libertar.
Fonte: Última Instância
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