Por Dentro da Lei

Por Dentro da Lei

14 de novembro de 2025

O matador de atenção plena e o autoconhecimento

 

A arte, mesmo singela, pode nos provocar reflexão. Explico: comecei a assistir uma série alemã, chamada “Assassino Zen” (Achtsam Morden). A história tem por personagem um advogado criminal, em crise com a família e desanimado com sua prática profissional.


Assassino Zen

Já no primeiro episódio, a esposa do advogado demanda que ele tome uma medida para melhorar sua relação com a filha pequena. E ela mesmo o aconselha a entrar num curso de “Achtsamkeit”, que significa “atenção plena”, ou “mindfulness”, como é mais conhecida. Após relutar, o advogado cede e vai ao consultório do orientador.

Como uma das primeiras lições, o orientador diz ao advogado que o vai ensinar a respirar. E aqui o destaque: durante a cena em que o orientador vai ensinar ao advogado a respiração, no momento em que este mesmo orientador fala, aparece na tela a palavra “atem”, que é justamente respiração em alemão.

É interessante, pois “atem” significa também “sopro”, no sentido de “sopro de vida” ou “sopro de Deus para dar a vida”. A respiração, portanto, requisitada pela atenção plena, que demanda a consciência do inspirar e do expirar, seria o movimento que traz à vista a noção de início à própria vida, o sopro de vida, ou seja, a consciência do existir e do estar presente.

O cotidiano nos afasta justamente disto! Dessa exata sensação de se estar presente onde e quando se está.

A sociedade moderna acabou se tornando um espaço do afastamento disso. Nós não estamos mais presentes. Ou estamos nas redes sociais, quando poderíamos (ou deveríamos) estar na realidade. Ou estamos mandando mensagens por aplicativos específicos para pessoas, enquanto estamos na companhia de outras. Cada um de nós acabou por se tornar “o homem que não estava lá” (numa menção ao filme dos irmãos Coen).

E, talvez, muitas vezes, nós deixemos de saber quem somos, porque “não estamos lá”, naquele exato lugar a que fomos lançados e que nos foi permitido viver. Nós não somos mais donos de nossa atenção plena!


8 de novembro de 2025

JOVEM PRESA PREVENTIVAMENTE POR 6 ANOS MORRE DE CÂNCER APÓS SER ABSOLVIDA



No último dia 3, foi noticiada a morte de Damaris Vitória Kremer da Rosa, de 26 anos, por câncer de colo no útero, 2 meses após ter sido absolvida da acusação de participação em homicídio qualificado. 

Chamam a atenção neste caso variadas ocorrências: a idade da jovem, a gravidade da doença que a acometeu, a morte após a absolvição, dentre outras. 

Mas, possivelmente, o que traz mais atenção é a presença do odioso erro judiciário. E este erro judiciário se configurou pela manutenção de uma prisão preventiva por seis (6) anos!



Damaris Vitória Kremer da Rosa morreu de câncer dois meses
após ser absolvida da acusação de homicídio (fonte: redes sociais)



Sem entrar na discussão dos elementos que justificavam tal prisão, por ser preventiva, por essa sua natureza, por seu conceito de criação e existência, por sua essência e razão de ser no processo penal, nenhuma prisão preventiva poderia durar tanto tempo.

Depois da Lei nº 12.403/2011, que trouxe a medidas cautelares alternativas à prisão preventiva, lei esta que relegou a último plano a aplicação do citado tipo prisional, o que justifica seu uso tão recorrente?

E, o que fundamentaria um encarceramento tão longo, que praticamente configurou o cumprimento de uma sentença condenatória?

Algo vai muito mal na nossa prática judiciária forense – e não é a inexistência de leis, como muitos dizem!

O que caminha mal é a falta de compreensão das leis, aliado ao desconhecimento da função do processo penal (que caminha mais ao som dos tambores midiáticos do que das lições da doutrina e jurisprudência); caminha mal porque normas e decisões são criadas e determinadas para agradar à opinião pública, para atender a requisitos ideológicos e não para cumprir o chamado da Justiça.

Porém, o que traz mais desesperança é ver que casos como este, desta desaventurada e injustiçada jovem, não vão provocar a devida reflexão aos responsáveis pela guarda do precioso instrumento que deveria ser o direito processual penal.